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terça-feira, 4 de agosto de 2015

Plágio: onde está e por que acontece?

A perspectiva ética de respeito aos direitos autorais e à propriedade intelectual sempre norteou a produção intelectual da USP. O Sistema Integrado de Bibliotecas da USP (SIBiUSP) tem procurado realizar ações integradas de conscientização e prevenção de ocorrência de plágio no ambiente acadêmico. As bibliotecas da USP sempre trabalharam junto aos docentes, estudantes e funcionários na orientação para a redação de trabalhos acadêmicos (teses e dissertações) e artigos científicos, tendo como foco a normalização de citações e referências.

A preocupação com os direitos autorais e propriedade intelectual não é recente. Entretanto, nos últimos anos, com o advento da Internet e a ampliação do acesso aberto à informação, as questões referentes à integridade da pesquisa e à prevenção da ocorrência do plágio têm suscitado discussões mais profundas.

Apesar de todas as informações disponíveis e a atuação diligente dos profissionais da informação, docentes e autores, compreender o conceito de plágio não é tarefa fácil. Nesse sentido, o trabalho do professor Marcelo Krokoscz merece destaque especial. Prestes a lançar sua mais recente obra Outras palavras sobre Autoria e Plágio, Krokoscz concedeu entrevista especial ao SIBiUSP.

SIBiUSP: Em poucas palavras, qual é a origem do plágio e seu significado nos dias atuais?
Marcelo Krokoscz: O plágio é um fenômeno que caracteriza uma fraude autoral. Surgiu na antiguidade (séc II a. C.), mas a concepção adotada hoje é resultado das mudanças nos processos editoriais e legislações autorais surgidas no início do século XVIII.
SIBiUSP: Como se detecta um plágio em um trabalho científico?
MK: É muito fácil detectar o plágio. Estudo realizado com professores indicou que oito em cada dez percebem que um trabalho escrito é plagiado apenas fazendo a leitura. Nem sempre o nível de erudição de um texto corresponde aos conhecimentos de quem responde pelo trabalho. Além disto, quando o trabalho é resultado de um processo de copiar e colar, fica flagrante algumas quebras de estilo e de coesão textual devido as diferenças nativas entre os textos originais. Contudo, na atualidade existem softwares dedicados exclusivamente a detecção do plágio.
SIBiUSP: Qual é o impacto do plágio na qualidade das pesquisas científicas? Como o plágio afeta a autoria de um trabalho científico?
MK: Fiz um estudo recente com trabalhos científicos publicados numa base de indexação da área das ciências sociais. Submeti uma amostra dos trabalhos publicados à um detector de plágio. O resultado foi que 65% dos trabalhos publicados continham plágio. A literatura internacional sobre o plágio reitera que o plágio no âmbito acadêmico tem nuances diferentes do plágio editorial, por exemplo. Sendo assim, embora o problema da redundância (autoplágio) seja inconcebível do ponto de vista editorial, no meio acadêmico é reprovável por causa do mérito associado ao ineditismo científico. Então, o problema maior do plágio acadêmico se refere ao comprometimento da reputação de quem escreve ou publica.
SIBiUSP: Que ações institucionais têm sido comumente adotadas nas universidades consideradas de classe mundial em relação ao plágio? Como aferir a eficiência dessas ações?
MK: O plágio é um problema de todos: alunos, professores, pesquisadores, editores e das instituições! De fato, cabe às escolas, universidades, periódicos, agências minimamente assumirem a sua parcela de responsabilidade em relação ao assunto. Definir o que é o plágio para o seu público, caracterizar quando e como pode ocorrer, estabelecer práticas de prevenção, oferecer treinamento de redação científica e apresentar regras e sanções relacionadas à prática do plágio e à integridade científica são ações constatáveis em muitas instituições internacionais.
A eficiência destas ações não garante plenamente que o plágio seja evitado, pois em parte ele ocorre por má fé de algumas pessoas que deliberadamente decidem cometer uma fraude autoral. Contudo, elas são importantes e necessárias para instrumentalizar aquelas pessoas que cometem plágio de forma acidental, isto é, não intencional, o que aliás, é o que ocorre com mais frequência.
SIBiUSP: Como você avalia as ações punitivas e as educativas dadas pelas instituições em relação ao plágio?
MK: As ações preventivas são mais importantes do que as punitivas. Apesar do que, estas são necessárias para evitar que o problema seja banalizado. Se acontece o plágio e isto é ignorado, e quando nos deparamos com casos flagrantes não acontece nada, facilmente pode-se criar a cultura de que é “algo que todo mundo faz”. Entretanto, antes da punição é preciso que haja uma codificação (regras e sanções) de modo que a adoção de medidas punitivas não sejam decisões tomadas aleatoriamente cada vez que surge um novo caso.
SIBiUSP: Em sua opinião, qual é o papel das bibliotecas com relação à prevenção da ocorrência do plágio?
Eu penso que as bibliotecas têm um papel fundamental em relação à prevenção e ao combate do plágio acadêmico. Tenho visto iniciativas interessantes neste sentido nos eventos internacionais sobre o assunto. Há por exemplo, um vídeo na internet preparado por uma biblioteca de universidade da Noruega e pude conhecer um website desenvolvido por uma biblioteca de uma instituição australiana com diversas informações, exemplos e exercícios sobre o plágio. Enfim, acho que, da mesma forma que as bibliotecas preocupam-se em desenvolver manuais de normalização de trabalhos acadêmicos, poderiam ajudar as instituições criando manuais de prevenção do plágio.
SIBiUSP: Em 2012, você participou de uma pesquisa sobre percepção de plágio junto aos alunos de pós-graduação da USP, realizada em parceria com o Sistema Integrado de Bibliotecas da USP . Como você avalia a os resultados? (situação dos alunos da USP em relação a alunos de outras universidades).
MK: O objetivo principal do trabalho que fizemos não foi verificar os índices e nem a frequência de ocorrência do plágio entre os estudantes. O que pudemos constatar foi que as percepções dos alunos da USP em relação ao plágio não são diferentes do que se verifica entre os alunos de outras instituições e países. Entretanto, a conclusão mais importante foi a análise que fizemos de que o fato de ter conhecimentos teóricos conceituais não é uma condição suficiente para garantir que o aluno entenda de forma adequada situações concretas que caracterizam o plágio. Ou seja, aponta uma nova fronteira sobre o assunto indicando que, embora informação e treinamento sejam importantes para evitar o plágio, isto são insuficientes para que o problema seja inteiramente superado.
SIBiUSP: Como avalia a situação do Brasil em relação à preocupação com o plágio?
Em minha opinião o plágio ainda não é assumido de forma satisfatória como um problema sério no país. Embora a CAPES tenha feito uma recomendação para que as instituições de ensino superior orientem os alunos sobre o assunto e algumas das principais agências de fomento à pesquisa tenham inserido o assunto em seus manuais de boas condutas científicas, considero que isto ainda é muito pouco. Por exemplo, é raro encontrar informações sobre orientações e políticas institucionais sobre o plágio nos websites das instituições de ensino brasileiras, nas diretrizes para autores dos periódicos científicos sequer consta a palavra plágio, nos livros de metodologia da pesquisa e manuais de elaboração de trabalhos acadêmicos o assunto é ignorado. A maioria das universidades internacionais utiliza softwares de detecção do plágio, mas aqui no Brasil ainda é bastante incomum uma instituição que faça este tipo de investimento.
SIBiUSP: Qual a contribuição de seu novo livro para a sociedade brasileira?
MK: Este livro é resultado de minha tese de doutorado defendida na USP em 2014. Trata-se de um trabalho teórico, diferente do primeiro livro que tem uma conotação prática, com conteúdo aplicado. Contudo, a reflexão desenvolvida nesta obra contribui para o debate sobre a importância de repensar os conceitos de plágio e autoria considerando-se o contexto das novas tecnologias da informação e comunicação. Disse acima que estes conceitos são oriundos da modernidade, contudo o mundo mudou muito nos últimos tempos e penso que é preciso repensar as ideias de autoria, propriedade e reprodução, entre outros, considerando-se a sociedade da informação caracterizada pela troca, fluidez, compartilhamento e colaboração. Neste âmbito, as noções de “meu” e “teu” já não são como eram…

Marcelo Krokoscz é doutor e mestre em Educação pela Faculdade de Educação (FE) da USP; membro da rede acadêmica mundial para o enfrentamento do plágio (PlagiarismAdvice.org); autor dos livros “Autoria e Plágio: um guia para estudantes, professores, pesquisadores e editores” (Atlas, 2012) e “Outras palavras sobre autoria e plágio” (Atlas, 2015); editor do website www.plagio.net.br e da revista Liceu Online. No meio acadêmico desenvolve pesquisas e apresenta conferências sobre autoria, interesse, originalidade e plágio no processo de produção, redação e publicação científica. É também professor de Metodologia Científica e Coordenador do Programa de Iniciação Científica na Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP) e diretor do Colégio FECAP. No meio editorial realizou trabalhos de consultoria técnica para a publicação de obras didáticas da Editora Moderna e da Editora Ática.

Da Divisão de Gestão de Desenvolvimento e Inovação do SIbiUSP
Mais informações: Atlas Virtual, email marcelix@usp.br


Fonte: USP

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